Me colocaram no tempo,me puseram
uma alma viva e corpo desconjuntado.Estou limitado ao norte pelos sentidos,
ao sul pelo medo, a leste pelo Apóstolo São Paulo, a oeste pela minha educação.
Me vejo numa nebulosa, rondando, sou um fluído,
depois chego à consciência da terra, ando como os outros,
me pregam numa cruz, numa única vida.
Colégio.Indignado, me chamam pelo número, detesto a hierarquia.
Me puseram o rótulo de homem, vou rindo, vou andando, aos solavancos.
Danço.Rio e choro, estou aqui, estou ali, desarticulado,
gosto de todos, não gosto de ninguém, batalho contra os espirítos do ar,
alguém da terra me faz sinais, não sei mais o que é o bem nem o mal.
Minha cabeça voou acima da baía, estou suspenso, angustiado, no éter,
tonto de vidas, de cheiros, de movimentos, de pensamentos,
não acredito em nenhuma técnica.Estou com os meus antepassados,
me balanço em arenas espanholasm é por isso que saio às vezes pra rua
combatendo personagens imaginários(...)
Estou do outro lado do mundo, daqui a cem anos, levantando populações...
Me desespero porque não posso estar presente a todos os atos da vida.
Onde esconder minha cara?O mundo samba na minha cabeça(...)
Tudo transparecerá: vulcões de ódio, explosões de amor,
outras caras aparecerão na terra.(...)
Almas desesperadas eu vos amo.Almas insatisfeitas, ardentes.Detesto os que se tapeiam, os que brincam de cabra- cega com a vida,os homens "práticos"...Viva São Francisco e vários suicídas e amantes suicídas,
os soldados que perderam a batalha, as mães bem mães,
as fêmeas bem fêmeas, os doidos bem doidos.
Vivam os tranfigurados, ou porque eram perfeitos ou porque jejuavam muito...
viva eu, que inauguro no mundo o estado de bagunça transcedente.
Sou a presa do homem que fui há vinte anos passados,
dos amores raros que tive, vida desertos vibrando sob os dedos do amor,
tudo é ritmo do cérebro do poeta.Não me inscrevo em nenhuma teoria, estou no ar,na alma dos criminosos, dos amantes desesperados(...),no pensamento dos homens que movem o mundo,
nem triste nem alegre, chama com dois olhos andando,sempre em tranformação.




Não farei comentários sobre o poema, é demasiado subjetivo, além disso perderia a "graça" qualquer tentativa de explicação.Ao intérprete cabe o sentido ou a falta de sentido daquilo que lê.

Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
- Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história.

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e o mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.

Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...

Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.
"Desconfiai do mais trivial ,na aparência singelo.E examinai, sobretudo, o que parece habitual.Suplicamos expressamente:não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,pois em tempo de desordem sangrenta,de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,de humanidade desumanizada,nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar."

O socialismo já parecia "impossível" de ser atingido desde a época que meu pai era universitário,mesmo que ele levantasse bandeira de socialista ou se colocasse como um defensor do movimento comunista, no fundo sabia que realidade não se tornaria, da mesma forma que hoje, com a formação de alguns valores e ideais que possuo, me parece impossível. Dentre outros óbvios e inúmeros empecilhos, talvez a impossibilidade se encontre no fato de que o socialismo requer sonhos altos, sonhos distantes do nosso comodismo, conformismo, egoísmo e mesquinhez... e todo o resto que o sistema capitalista nos torna.

Sonho que requer negação de conforto, porque para concretizá-lo precisa-se de homens e mulheres dispostos a lutar, todos os dias, incessantemente por si e por todos.

Neste século o socialismo se tornou mais distante do que nunca, como diz Boaventura de Sousa Santos, o capitalismo ainda que selvagem ,impregnou de tal modo que é idolatrado, tanto racional quanto irracionalmente.

Apesar de também participar do imenso, desigual e desumano “grupo capitalista”, eu ainda tenho vontade de “enlouquecer” um pouco em busca de um sonho coletivo...Mesmo que eu utilize nike, adidas,consuma Mc Donald’s, utilize kippling, coca-cola, ar – condicionado praticamente o dia inteiro... não pensaria muito em trocar tudo isso por uma razão verdadeira de viver.Possuo oportunidades para não ser esmagada pela massificação que a globalização(intrínseca ao capitalismo)causa, e permitir que outras pessoas, outros povos, minorias... Não se tornem invisíveis nesta sociedade, nesta estrutura...

Espero não me perder no caminho e esquecer aquilo que hoje eu realmente acredito e consigo perceber já que não tenho poder, status nem dinheiro para vendar os meus olhos.E sobretudo, ter a consciência que existem seres humanos, logo, semelhantes, em todos os lugares do mundo, abandonados e relegados à invisibilidade.

Observações:

*Segundo Eduardo Galeano a cadeia McDonald's dá brinquedos de presente aos seus clientes infantis( Mc lanche feliz).Esses brinquedos são fabricados no Vietnã, onde os operários trabalham dez horas seguidas, em galpões hermeticamente fechados, em troco de oito centavos.

*O preço de uma camiseta com a imagem da princesa Pocahontas, vendida pela Disney, equivale ao salário de toda uma semana do operário que costurou a tal camiseta no Haiti, num ritmo de 375 camisetas por hora
(Tudo bem que Pocahontas já esta fora de moda a bastante tempo, mas já fora motivo de crueldade para muitos trabalhadores, tanto quanto os presentes modismos que consumimos)
.

Interessante e pertinente crítica do sarcástico Eduardo Galeano:


Mapa- múndi
Ao sul, a repressão.Ao Norte, a depressão.
Não são poucos os intelectuais do Norte que se casam
com as revoluções do Sul só pelo prazer de ficarem viúvos.Prestigiosamente choram, choram a cântaros, choram mares, a morte de cada ilusão; e nunca demoram muito para descobrir que o socialismo é o caminho mais longo para chegar do capitalismo ao capitalismo.
A moda do Norte, moda universal, celebra a arte neutra e aplaude a víbora que morde a própria cauda e acha que é saborosa.A cultura e a política se converteram em artigos de consumo.Os presidentes são eleitos pela televisão, como os sabonetes, e os poetas cumprem uma função decorativa.Não há maior magia do que a magia do mercado, nem outros heróis mais heróis do que os banqueiros.
A democracia é um luxo do Norte.Ao Sul é permitido o espetáculo,que não é negado a ninguém.E ninguém se incomoda muito, afinal, que a política seja democrática, desde que a economia não o seja.Quando as cortinas se fecham no palco, uma vez que os votos foram depositados nas urnas, a realidade impõe a lei do mais forte, que é a lei do dinheiro.Assim determina a ordem natural das coisas.No Sul do mundo, ensina o sistema, a violência e a fome não pertencem à história, mas à natureza, e a justiça e a liberdade foram condenadas a odiar-se entre si.