Nestes três últimos dias andei refletindo sobre algumas coisas que sempre me incomodaram e que, felizmente, nunca tapei meus olhos. Desde que entrei na faculdade digo que mudei (para melhor), percebo que me torno a cada dia uma pessoa menos alienada, logo, um pouco mais esclarecida. E esse mesmo discurso eu já ouvi e ouço de colegas, de professores, de todos aqueles que de alguma forma fazem parte de um espaço voltado para o conhecimento científico(pensa-se).E no decorrer do tempo, formamos grupos de estudos bem particulares, participamos de grupos de pesquisa/extensão e também dos grupos de estudos idealizados pelos professores.

E assim, “avançando” a cada período - falo especificamente do curso de Direito- nos julgamos críticos, solidários, altruístas, progressistas,militantes pelas causas sociais... Trancamo-nos em um “mundo” que nos faz ter a ilusão que temos alguma coisa tão mais especial do que aquele que leu somente um cebolinha na vida- até que realmente poderíamos ser, mas NÃO SOMOS.Alguns se tornam até antipáticos, cheios de palavrinhas, brocardos e outras frescurinhas que só fazem parecer mais patéticos do que já são.O que acontece no mundo real é o inverso,acreditamos possuir autoridade para falar de qualquer assunto e não nos permitimos contatos com algumas pessoas, por puro preconceito e vaidade.
A verdade é que nos tormanos ridículos, formalistas, frios, falsos moralistas, egoístas e mesquinhos. Travamos discursos sobre emancipação segundo Paulo Freire, segundo Boaventura... e quando temos uma simples oportunidade de compartilhar um “pequeno” conhecimento ou uma “pequena” informação com um colega de turma, preferimos não dividir para que ele não faça o mesmo que eu fiz, para que ele não escreva o mesmo que escrevi, e sobretudo, para que ele não tire nota melhor do que a minha.Debatemos as críticas feitas ao Direito e aos juristas por Bourdieu, e até mesmo Marx, com uma visão tão ortodoxa(em alguns pontos realistas), nos empolgamos, sonhamos salvar o mundo, ser um jurista diferente(para quem prefere:operador do Direito), mas somos iguaiszinhos a todos aqueles que achávamos ou achamos uns idiotas vestidos de paletó e gravata(há raras exceções).

Nossa linguagem se torna quase que inacessível, até nosso modo de se vestir - somos mais padronizados do que nunca-Mas mesmo assim, continuamos nos achando diferentes.Cheios de si porque lemos o filósofo tal, o pensador tal, gostamos do estilo de música tal...Mas, infelizmente, somos todos igualmente ridículos.Repetimos tudo aquilo que criticamos, tudo(ou quase tudo) aquilo que dizemos causar ojeriza, indignação...

Eu tenho pena de mim, eu tenho pena de ti, pena de todos aqueles que vivem iludidos, tentando provar dia após dia que é o mais inteligente, o mais humanitário, que decorou todo o código de processo civil, que participou de grandes e bons congressos, que aprendeu a diferença entre acessória jurídica e assistência jurídica, que entendeu e que LEU a "razão pura" de Kant,que lê Kelsen...

Tenho pena daqueles que vivem no erro, na vaidade, no orgulho, na linguagem que distancia;na falta de educação que machuca;na fantasia de que tem algum poder divino e que por isso deve ser idolatrado e tido como ídolo .Eu faço parte de tudo isso, você faz parte de tudo isso.Me julgo crítica porém, deixo passar como uma simples(por COMODISMO) realidade algo que afirmo repudiar.Porém, eu me reconheço e não sou HIPÓCRITA.
Ninguém que pense que me engana através de discursos, de demonstrações públicas de intelectualidade, odeio pseudo qualquer coisa.Quem É alguma coisa ou “TEM” alguma coisa ,não precisa contar nada para ninguém, simplesmente, agem conforme os seus ideais.Foram e são aqueles que realmente construíram algo para uma coletividade,para o bem comum... no anonimato, sem fama,sem as luzes, sem o status...

Tenho pena acima de tudo, desse povo que não teve acesso ao cebolinha e que são humilhados todos os dias por gente que após ter lido “milhares” de livros durante alguns anos, não aprenderam o que é SER HUMANO.Mas não se enganem, os analfabetos são espertos e inteligentes.Talvez bem mais do que você que se vangloria cantando mentiras aos ventos, banalizando crueldades que comete e que concente todos os dias; silenciando opressões que seus olhos já acostumaram ver...e sendo mais um fantoche da vida, porém, na utópica luta "por um mundo melhor".

PS:Momento oportuno para eu deixar aqui a poesia da Cleide Canton que o seu verso final pertence a Ruy Barbosa, como já rola há um bom tempo aí pela internet.


"Sinto vergonha de mim por ter sido educador de parte desse povo,
por ter batalhado sempre pela justiça, por compactuar com a honestidade,
por primar pela verdade e por ver este povo já chamado varonil
enveredar pelo caminho da desonra.
Sinto vergonha de mim por ter feito parte de uma era que lutou pela democracia,
pela liberdade de ser e ter que entregar aos meus filhos,
simples e abominavelmente, a derrota das virtudes pelos vícios,
a ausência da sensatez no julgamento da verdade,
a negligencia com a família, célula-mater da sociedade,
a demasiada preocupação com o "eu" feliz a qualquer custo,
buscando a tal "felicidade" em caminhos eivados de desrespeito para com o seu próximo.
Tenho vergonha de mim pela passividade em ouvir,
sem despejar meu verbo, a tantas desculpas ditadas pelo orgulho e vaidade,
a tanta falta de humildade para reconhecer um erro cometido,
a tantos "floreios" para justificar atos criminosos,
a tanta relutância em esquecer a antiga posição de sempre "contestar",
voltar atrás e mudar o futuro.
Tenho vergonha de mim pois faço parte de um povo que não reconheço,
enveredando por caminhos que não quero percorrer...
Tenho vergonha da minha impotência, da minha falta de garra,
das minhas desilusões e do meu cansaço.
Não tenho para onde ir pois amo este meu chão,
vibro ao ouvir meu Hino e jamais usei a minha Bandeira
para enxugar o meu suor ou enrolar meu corpo
na pecaminosa manifestação de nacionalidade.
Ao lado da vergonha de mim, tenho tanta pena de ti, povo brasileiro!
De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra,
de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus,
o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto."

5 comentários:

Anônimo disse...

Será que dá pra você ouvir as minhas palmas?
Ressalvas e mais ressalvas. Gostei do teu texto, não,melhor, amei!
Quem disse que quem se inflama de sentimentos não encherga nada?
Você viu a verdade e agora (ou sempre) sabe tão bem que todos esses conhecimentos adquiridos (não só pelos engravatados, mas por todo e qualquer assimilador de conhecimento-isso mesmo, pessoas assim só assimilam não digerem nem sabem fazer bom proveito disto na vida)muito pouco garantem o que realmente importa na vida, são apenas uma muleta, um tijolo a mais, mas não te faz ser mais sensivel, nem mais humano.
Um analfabeto, ou aquele que tem pouco estudo é tanto ou mais capaz do que qualquer um que tenha terminado todo o seu caminho pela vida educacional institucional (fazendo phgd, doutorado, mestrado -o diaxo a quatro -rs), vide Cartola, poeta.
Poesia e educação estão para além de textos adquiridos em um faculdade: são sentimento e gentileza (já diria o profeta).
Até!
[empolguei-me!]
bjs, Greice

Anônimo disse...

*enxergar


[greice]

Olga disse...

*pela= existe sim

Anônimo disse...

Singelo comentário : antes de tudo tenho que dizer que adorei o post olga! Super crítico.Também já tinha pensado nisso...sobre como a gente se orgulha de saber isso ou aquilo, de ler determinado autor ou escutar certos tipos de música etc, mas é como tu bem escreveste, "eu tenho pena de mim, tenho pena de vc..."

bjs

Isabel Lopes disse...

Achei as observações muito boas.
Ler e ler não nos faz superiores à ninguém.
O que nos difere dos demais, são nossos comportamentos, nossa forma de pensar e agir.
Aprender é sempre muito bom.
Se dispor a ser cada vez melhor, é louvável.
Mas, se engrandecer por isso, é uma tolice, que insistimos em cometer.

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